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Ciencia y enfermería

versión On-line ISSN 0717-9553

Cienc. enferm. vol.22 no.3 Concepción set. 2016

http://dx.doi.org/10.4067/S0717-95532016000300107 

INVESTIGACIÓN

DIFICULDADES DE PROFISSIONAIS NA ATENÇÃO À SAÚDE DA PESSOA COM SURDEZ SEVERA

PROFESSIONAL DIFFICULTIES IN HEALTH CARE OF PATIENTS WITH SEVERE DEAFNESS

DIFICULTADES PROFESIONALES EN LA ATENCIÓN EN SALUD A LA PERSONA CON SORDERA SEVERA

Eurípedes Gil de França 1  

Maiary Andrade Pontes 2  

Gabriela Maria Cavalcanti Costa 3  

Inácia Sátiro Xavier de França 4  

1 Enfermeiro. Doutorando. Universidade Estadual da Paraíba. Campina Grande, Paraíba, Brasil. Brasil. E-mail: euripedesgf@ gmail.com

2 Enfermeira. Universidade Estadual da Paraíba. Campina Grande, Paraíba, Brasil. E-mail: maiary.uepb@hotmail.com

3 Enfermeira. Professora Doutora. Universidade Estadual da Paraíba. Campina Grande, Paraíba, Brasil E-mail: gabymcc@bol.com.br

4 Enfermeira. Professora Doutora. Universidade Estadual da Paraíba. Bolsista de Produtividade CNPq. Campina Grande, Paraíba, Brasil. E-mail: inacia.satiro@gmail.co

RESUMO

Objetivo:

Investigar as dificuldades de profissionais da saúde para a realização da consulta com a pessoa com surdez severa.

Materiais e métodos:

Estudo transversal, descritivo e qualitativo, realizado em março de 2011, na rede de atenção primária em saúde de Campina Grande - Paraíba. Utilizou-se um questionário estruturado, e 89 profissionais da saúde da Estratégia de Saúde da Família responderam sobre dificuldades para a consulta ao surdo. As respostas foram categorizadas por meio de Análise de Conteúdo na Modalidade Temática.

Resultados:

Dentre as dificuldades, destacaram-se: comunicação prejudicada, déficit na formação de recursos humanos para a consulta e reconhecimento das necessidades de saúde, infraestrutura inadequada para acolhimento e atendimento ao surdo, incerteza com relação aos cuidados em saúde prescritos na consulta e prejuízo da au tonomia do paciente.

Conclusão:

Percebeu-se que a comunicação prejudicada constitui uma barreira para a promoção de saúde e que profissionais e unidades de saúde não estão capacitados para acolher e atender às necessidades de saúde da pessoa com surdez severa.

Palavras chave: Surdez; pessoal de saúde; atenção à saúde; barreiras de comunicação; enfermagem

ABSTRACT

Objective:

To investigate the difficulties for health care professionals when dealing with patients with severe deafness in a medical appointment.

Method:

This is a cross-sectional, descriptive and qualitative study conducted in March 2011 in the Primary Health Care Network of Campina Grande - Paraíba. We used a structured questionnaire completed by 89 health professionals working in the Health Family Strategy. They were asked about the difficulties when dealing with deaf patients in a medical appointment. Their answers were categorized by means of a Thematic Content Analysis.

Results:

Among the main difficulties we find: impaired communication, a lack of trained human resources for these appointments and an insufficient recognition of these health needs, inappropriate infrastructure for deaf patient reception and care provision, uncertainty regarding the quality of the care provided at the medical appointment and the patient's lack of autonomy.

Conclusions:

We found that an impaired communication is a barrier to health promotion and that both health professionals and health units are not able to receive and meet the health needs of a patient with severe deafness.

Key words: Deafness; health personnel; health care; communication barriers; nursing

RESUMEN

Objetivo:

Investigar las dificultades de los profesionales de salud para la realización de la consulta con la persona con sordera severa.

Materiales y métodos:

Estudio transversal, descriptivo y cualitativo, realizado en marzo de 2011, en la red de atención primaria de salud de Campina Grande - Paraíba. Se utilizó un cuestionario estructu rado, y 89 profesionales de salud de la Estrategia de Salud de la Familia respondieron sobre las dificultades para la consulta con el sordo. Las respuestas fueron categorizadas a través del Análisis de Contenido en la Modalidad Temática.

Resultados:

Entre las dificultades, se destacaron: comunicación perjudicada, déficit en la formación de recursos humanos para la consulta y reconocimiento de las necesidades de salud, infraestructura inadecuada para acoger y atender al sordo, incertidumbre con respecto a la atención sanitaria prescrita en la consulta y per juicio de la autonomía del paciente.

Conclusiones:

Se observó que el déficit en la comunicación constituye una barrera para la promoción de la salud y que profesionales y unidades de salud no están cualificados para acoger y atender a las necesidades de salud de la persona con sordera severa.

Palabras clave: Sordera; personal de salud; atención a la salud; barreras de comunicación; enfermería

INTRODUÇÃO

A atenção à saúde da pessoa com deficiência (PcD) diferencia-se entre aquilo que é pro posto e o que existe na prática cotidiana dos serviços de saúde, visto que a sociedade pare ce não estar preparada para atender integral mente às necessidades de saúde desse públi co, resultando em dificuldades para a prática da inclusão social, acessibilidade e agrava mento da deficiência. Diante disto, discute se a importância de se estabelecer estratégias que envolvam a família, a comunidade, ser viços e profissionais da saúde, como meio de integralizar a assistência às necessidades das PcDs1.

Discutir ressocialização e autonomia sig nifica refletir inicialmente sobre a qualidade de vida, assistência à saúde da PcD e como estas impactam na vida desses usuários(2, 3). Mesmo considerando os avanços da ciên cia, dos sistemas de informação e tecnologias no processamento de dados, as informações quanto às reais necessidades de saúde das PcD são incompletas, resumindo-se a dados gerais (como aspectos sociodemográficos).

Nesse contexto, percebe-se ainda a falta de dados que evidenciem problemas de saúde de ordem biopsicossocial, discriminação e o preconceito, que dificultam tanto a empregabilidade quanto as condições propícias para o desenvolvimento de atividades laborais4, além de casos de violência sexual e doméstica 5.

Com o intuito de deter o desenvolvimen to de doenças crónicas e investir na qualida de da atenção e da assistência aos pacientes, o Ministério da Saúde do Brasil ampliou a Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS) como forma de alcançar todos os públicos e considerando suas necessidades de saúde. A Estratégia de Saúde da Família (ESF) apresenta-se como método utilizado para consolidação da Atenção Primária, mas somente com as novas prioridades em saúde possibilitou-se o alcance de populações com deficiência. A PNPS objetiva, por meio das unidades de saúde, diagnosticar agravos em saúde, tratá-los em nível primário, educar a população e prevenir novos casos6.

As inadequações para acessibilidade e consulta a PcDs são relatadas na literatu ra e estão relacionadas ao déficit locomotor dessas pessoas, à falta de conhecimento dos profissionais da saúde em atender às neces sidades específicas das PcD, às barreiras físi cas nas unidades de saúde e atitudinais, bem como à falta do conhecimento do potencial das pessoas com deficiência4,7. Nesse sen tido, ainda que se considerem políticas, leis e decretos que garantam direitos nos cuidados em saúde e acessibilidade às PcD, este grupo populacional possui restrições no que se re fere ao usufruir dos benefícios garantidos nas legislações7.

Dentre as deficiências, a auditiva acome te o usuário de três formas: surdez bilateral, parcial ou total (esta considerada também surdez severa ou profunda)8. Usuários do terceiro nível, também chamados de surdos - ou pessoa com surdez severa (PcSS) - apre sentam capacidade de escutar que varia desde a diminuição severa à perda total da audição, verificada por meio de exame de audiome tria. Dentre os tipos de deficiência, a surdez severa destaca-se especialmente em relação à dificuldade em promover interação social, e esta se reflete no dia a dia como resultante da impossibilidade de estabelecer comunicação interpessoal9,10.

No contexto da comunicação, a limitação auditiva restringe as relações interpessoais, afetando também o acesso da PcSS aos servi ços de saúde. A Unidade Básica de Saúde da Família (UBSF) atua como porta de entrada dos serviços de saúde; entretanto, há rela tos11 da precariedade no acolhimento às pessoas com limitação físico-sensorial visto à inacessibilidade aos ambientes e o despre paro profissional.

Em se tratando disso, evidencia-se11 que profissionais da saúde não possuem ca pacitação adequada para comunicar-se com a PcSS, resultando em déficit na qualidade da consulta e grau de satisfação do usuário. Verificou-se também que as PcSS possuem necessidades de saúde que vão além da defi ciência, mas não são diagnosticadas devido à falta de preparo do profissional em estabele cer um elo de entendimento.

Devido à incipiência das pesquisas em relação às consultas de saúde às PcDs11, pouco se discute sobre a interação entre o profissional da saúde e a PcSS, a percepção do profissional e sua satisfação com o atendi mento prestado. Investigar a opinião de pro fissionais com relação a esse tipo de assistên cia, conforme suas experiências assistenciais no dia a dia, no âmbito do Sistema Único de Saúde, possibilitará auxílio para o fomento de subsídios com fins de melhoria na forma ção e aperfeiçoamento de recursos humanos em saúde, em especial na área de atuação em questão.

Diante do exposto, questionou-se: quais dificuldades os profissionais da saúde enfren tam durante a consulta à PcSS? Para respon der a esse questionamento, o presente estudo teve como objetivo investigar as dificuldades de profissionais da saúde para a realização da consulta à pessoa com surdez severa.

MÉTODO

Estudo descritivo e transversal. O presente estudo é uma análise qualitativa de parte de dados originais da Dissertação de Mestra do intitulada: "Atenção à saúde do surdo na perspectiva do profissional da saúde". A pes quisa foi realizada em Campina Grande - Pa raíba, em março de 2011, em 63 unidades de atenção primária à saúde da população.

Os dados foram coletados com 89 profis sionais de saúde de nível superior, sendo 36 enfermeiros, 27 médicos, 18 cirurgiões den tistas, 5 assistentes sociais e, por fim, 1 fisiote rapeuta, 1 psicóloga e 1 fonoaudióloga. Estes, em sua prática clínica, já haviam consultado uma PcSS. Logo, estavam aptos a responder o seguinte questionamento: em sua opinião, considerando sua última consulta a um pa ciente com surdez severa, quais foram as dificuldades encontradas para realização da consulta, considerando o atendimento em si?

Há de se registrar que, por se tratar de um recorte, este estudo não adotou qualquer cri tério para dimensionar a amostra qualitativa, a não ser o reconhecimento de experiência clínica declarada pelos profissionais.

Adotou-se como instrumento um for mulário estruturado em quatro seções, que abordava respectivamente: dados de identi ficação, dados do atendimento ao surdo, da dos sobre conhecimento de Libras (Língua Brasileira de Sinais) e, por fim, dados sobre capacitações em comunicação com surdo. Na seção dois deveriam falar sobre quais as dificuldades enfrentadas para o atendimento e quais as sugestões para minimizar as ditas dificuldades. Cada profissional respondeu individualmente ao instrumento de pesqui sa, tendo sido, portanto, analisados 89 formulários.

Para a coleta de dados, os encontros fo ram agendados no serviço de saúde, em ho rário e dias previamente pactuados com os profissionais. De posse do material empírico, adotou-se como técnica de análise de dados a análise de conteúdo, na qual se faz o tra tamento por inferências e interpretações. Se gundo Minayo 12, diferentes são os tipos de análise de conteúdo: de expressão, das re lações, de avaliação, de enunciação e catego rial temática.

Para a autora, a categorização consiste no processo de redução do texto às palavras e expressões significativas, sendo necessário, portanto, seguir as etapas: 1) pré-análise, 2) exploração do material e 3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação. Des tarte, emergiram as categorias temáticas: "deficiência na formação de recursos hu manos", "infraestrutura inadequada para o atendimento ao surdo", "incertezas quanto à promoção da saúde do surdo" e "restrição à autonomia do usuário".

Para cumprir o que determina a Resolu ção 466/2012, foi solicitada aos sujeitos a as sinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido após compreenderem os obje tivos da pesquisa e terem todas as informa ções sobre a garantia da não divulgação dos nomes e a confidencialidade das informações por elas oferecidas, além da preservação do direito de interromper a sua participação quando lhes fosse conveniente. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual da Paraíba, confor me o CAAE n° 0368.0.133.000-10.

RESULTADOS

Categoria 1: Deficiência na formação de recursos humanos

Os profissionais reconheceram que possuem déficit de conhecimentos para consultar a PcSS, bem como falta de preparo adequado para diagnosticar problemas de saúde e in teragir com essa clientela. Informaram não terem recebido conhecimento específico na graduação que possibilitasse discussões e ca pacitação para o acolhimento e atendimento ao surdo. Considerando suas opiniões com relação à Gestão em Saúde da Família, ale garam que não há oferta de cursos de trei namento para o aprendizado de formas de comunicação com as PcSS. Essas ideias niti damente são evidenciadas nos depoimentos:

Falta de compreensão para poder passar melhor as orientações (Enfermeira 6). Falta de domínio da linguagem Libras por mi nha parte (Enfermeira 19). Falta de habilidade na comunicação, tendo em vista a não capacitação para lidar com o surdo (Enfermeira 34).

Não tenho habilidade em falar com o surdo, nem fui capacitado para tal (Médico 29).

Categoria 2: Infraestrutura inadequada para o atendimento ao surdo

Registraram-se questões de infraestrutura inadequadas para o acolhimento e falta de recursos interativos para o auxílio durante a consulta. Os profissionais lamentam a inexis tência de recursos audiovisuais que pudes sem favorecer o entendimento da PcSS a res peito de suas queixas e como informá-las ao profissional. Segundo os participantes, não são todos os surdos que conseguem falar por Língua Brasileira de Sinais (Libras), portanto outros recursos para o uso da linguagem não verbal devem estar disponíveis:

Faltam materiais (brinquedos... ) (Fonoaudióloga 1).

Falta de algo visual que colaborasse na comu nicação com o usuário; também se houvesse um tempo maior para o atendimento destinado a esse usuário [...] Incapacidade na linguagem de sinais (Enfermeira 23).

Categoria 3: Incertezas quanto à promoção da saúde do surdo

Os profissionais citaram a comunicação pre judicada com a PcSS como principal proble ma para a realização da consulta, conforme evidenciado a seguir:

Dificuldade de entender e ser entendida (Enfer meira 8).

Quando o processo de fala e escuta não "ocorre", não há como haver uma boa comunicação (En fermeira 16).

Dificuldade de comunicação e compreensão (Assistente social 2).

Não houve comunicação médico/paciente nem vice-versa, deixando este vínculo não estabele cido (Médica 32).

Categoria 4: Restrição à autonomia do usuário

Registrou-se que alguns profissionais so licitaram que o surdo retornasse à unidade acompanhado de um ajudante (familiar ou intérprete). Estes atuam como intermedia-dores, porém, por vezes, restringem a au tonomia do surdo quando a consulta se dá mais entre profissional e acompanhante, como evidenciado a seguir:

Dificuldade de entender através de gestos, em bora a comunicação tenha se dado mais com a mãe que a acompanhava (Enfermeira 13). Paciente não fala, quem fez a consulta foi a mãe que estava acompanhando o paciente (Médica 5).

O fator comunicação foi totalmente comprome tido já que não soube me comunicar ou repassar a informação clínica para o paciente, apenas para o seu acompanhante, algo frustrante, pois não sei como a informação chegou à mesma (Enfermeira 31).

O usuário atendido estava acompanhado, por tanto é difícil dizer se os relatos do acompanhante corresponderam àquilo que o paciente realmente sente ou quer dizer (Médica 31).

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

A boa prática em saúde imprescinde do ins trumento básico "Comunicação". Ao não uti lizá-lo de forma eficaz e eficiente, corre-se o risco de a consulta apresentar lacunas, im precisões ou incorreções. No caso específico da comunicação PcSS-profissional de saú de, o Estado brasileiro já tomou a iniciativa de legislar a respeito sancionando a Lei N°10.436/ 2002, regulamentada pelo Decreto 5.626/2005. Neste Decreto, consta que a rede de serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) deve atender às pessoas surdas ou com defi ciência auditiva, além de apoiar a formação e capacitação dos seus profissionais para o uso de Libras e sua tradução e interpretação13.

No presente estudo, foi uma queixa co mum a falta de capacitação em Libras, con tribuindo com a dificuldade dos profissio nais de saúde entrevistados em orientar melhor as PcSS. Contudo, acredita-se que a médio prazo essas queixas sejam minimi zadas, dado que o ensino da Libras está se disseminando nos cursos de formação de re cursos humanos para a saúde. Isto porque as Instituições de Ensino Superior já passaram a inserir no Projeto Pedagógico dos cursos da área de saúde e afins o componente Libras, possibilitando aos formandos a aquisição de habilidades e competências em Libras e para que a comunicação com a PcSS se desenvolva a contento.

Apesar dos participantes deste estudo re velarem falta de habilidade e de competência na comunicação com a PcSS, consoante rela to de outros estudos (14), ao se afirmar essas limitações, os participantes deixam latente a necessidade de rever as próprias atitudes em relação à comunicação com essa pessoa, e de buscar a aquisição de recursos técnicos que possibilitem respeito e valorização dos direi tos e desejos desse indivíduo.

No concernente às questões de infraestrutura inadequadas para o acolhimento e de falta de recursos interativos para o auxí lio durante a consulta, urge inferir que estes aspectos se constituem barreiras de acessi bilidade aos serviços de saúde, visto que a ausência de recursos técnicos que facilitem a comunicação da díade PcSS-profissional de saúde possibilita a ocorrência de vieses de in terpretação, seja relacionados com as queixas da PcSS ou com as orientações do profissio nal.

Em se tratando da consulta de Enferma gem, autores15 relatam que, no concer nente a esse procedimento, o cuidar depende da interação entre cuidador e ser cuidado, e que as possíveis limitações durante a intera-ção podem gerar entraves no processo comu nicativo e falhas nas intervenções.

As propostas quanto à melhoria do pro cesso de comunicação remetem prioritaria mente à formação acadêmica. Observa-se, na literatura, que profissionais da saúde e da educação sentem a necessidade desse apren dizado. Verifica-se, em estudo16, que os profissionais reconhecem os direitos da PcSS e concordam que o processo de inclusão so cial passa pela identidade individual, que no caso desses indivíduos trata-se de sua língua peculiar.

Considera-se, contudo, que a escassez de recursos materiais e a infraestrutura ina dequada das unidades de saúde dificultam o processo de interação profissional-PcSS, considerando-se que, ainda que o profissio nal seja capacitado a comunicar-se por meios não verbais, nem toda PcSS possui o conhe cimento formal da Libras. Dessa forma, e consoante outros autores14, diferentes es tratégias de comunicação devem estar dispo níveis, como materiais ilustrativos, vídeo-au las, cartazes, peças anatómicas e brinquedos que promovam essa interação.

Na perspectiva de melhorar a comunica ção do profissional de saúde com o surdo, pesquisadores locados na academia capa citam os seus alunos por meio de leituras, debates e a utilização de vídeo nas vivências com participação de pessoas surdas. Para os autores, essa prática motivou os alunos a de senvolverem conhecimentos, habilidades de comunicação e atitudes positivas em relação a pacientes surdos14.

Em se tratando da promoção da saúde da PcSS, também é preciso considerar que exis tem aquelas PcSS que só conseguem se co municar por meio da linguagem oral e aque las que só conseguem se expressar por meio da Libras. Daí porque, para além dos resulta dos do estudo atual, o surdo se considera em desvantagem perante o ouvinte e exemplifica essa condição com a dificuldade em compre ender informações transmitidas em ambien te de trabalho, visto que costumam ser difun didas apenas pela modalidade oral17.

Essas situações específicas da comunica ção com a PcSS trazem implicações ao pro cesso assistencial porque dificultam o em-poderamento do indivíduo para tomar suas próprias decisões e usufruir os seus direitos de cidadania. Nesse sentido, autores alertam para o fato de que as atividades inerentes à promoção e prevenção em saúde auditiva ainda são muito restritas. Há, pois, que se lançar mão de capacitações dos profissionais de saúde atuantes nos processos de assistên cia à PcSS. Neste proceder, é preciso que o processo ensino e aprendizagem seja norte ado por métodos motivadores, reflexivos e críticos para que os educandos sejam sujeitos ativos18.

Outrossim, o aprendizado das formas de comunicação não verbal, mais que uma questão de saúde pública, remete à respon sabilidade ética e social, pois o acolhimento da PcSS, por meio da compreensão das men sagens que elas emitem, resulta em inserção social e valorização do ser humano. Entende-se, portanto, que o principal instrumento de trabalho do profissional passa a ser a comu nicação19.

Devido à inabilidade profissional em se comunicar por meio da Libras, uma prática comum de alguns profissionais consiste em solicitar que a PcSS se faça acompanhar por um familiar para intermediar o diálogo no decurso da consulta. Entende-se que a con vivência parental permite ao acompanhante definir formas de comunicação, muitas vezes informais, porém eficazes quanto ao enten dimento entre usuário e familiar, além do conhecimento do estilo de vida e das necessi dades de saúde da PcSS.

A consulta em presença de acompanhan te revela-se como estratégia para reduzir as possibilidades de diagnósticos e tratamentos errados, o que favorece diretamente a PcSS; no entanto, nega-se a esta pessoa o direito ao diálogo direto, comprometendo as ações de ressocialização deste indivíduo no âmbito da assistência à saúde. Percebe-se que, mesmo com acompanhantes ou intérpretes, o en contro entre profissionais e PcSS é permeado por barreiras de comunicação que compro metem o vínculo e a assistência19.

A intermediação da comunicação pelo acompanhante tem implicações negativas para a PcSS, pois à medida que o acompa nhante pergunta e responde por ela, torna-se notória a perda da sua autonomia. Uma vez cassado o seu direito de diálogo direto com o profissional, admite-se a sua exclusão da so ciedade ouvinte. Também há que se pensar nas possíveis implicações éticas decorrentes de desrespeito à privacidade da PcSS e de quebra de sigilo acerca de agravos que ela não queira socializar com o acompanhante.

Em resposta à questão norteadora deste estudo, os participantes enfrentam dificul dades na consulta a PcSS devido à infraestrutura inadequada para o atendimento e à falta de capacitação em Libras. Dessa forma, a possibilidade de malefício, em decorrência da falta de comunicação eficaz, não apenas se reflete na saúde da PcSS, mas pode resultar em frustração para o profissional ao reco nhecer a sua inaptidão para a resolução de problemas específicos do mundo da surdez.

Em meio às incertezas e demais sentimen tos de impotência que permeiam a assistên cia à saúde da PcSS, frustração e insegurança apenas serão minimizadas ao passo que o profissional for inserido no mundo da surdez por meio da compreensão das particularida des desta cultura16. Pensar em prejuízo unilateral (somente para o surdo) significa negligenciar as preocupações do profissio nal, desvalorizar seu esforço e culpá-lo pela incapacidade na resolução de problemas de saúde.

Mesmo existindo capital jurídico que re gulamenta o atendimento às necessidades es peciais da PcSS e fomenta o aperfeiçoamento profissional, os serviços de saúde e as insti tuições formadoras ainda têm dificuldade em atender às exigências ministeriais para o bom desempenho de tais ações. Talvez porque não perceberam, ainda, essa legislação como um incentivo a processos inovadores, ampliado res das chances de resolubilidade das ações em saúde para casos especiais como a surdez.

Necessita-se, portanto, de ações progra madas entre gestão dos serviços, instituições de ensino, profissionais da saúde e comuni dades, a fim de que os currículos atendam às necessidades prioritárias da cultura surda e a integralidade seja de fato exercida como direito do usuário nos cuidados à sua saúde. Mediante isto, os profissionais conseguirão desenvolver consultas mais eficazes e promo ver uma atenção integral como parâmetro fundamental para as estratégias em Atenção Primária.

Conclui-se que a falta de infraestrutura e de recursos adequados para o acolhimentos da PcSS resultam em estratégias improvisa das, informais, que restringem a identifica ção da real necessidade deste usuário. A difi culdade de interação profissional-PcSS com promete a prescrição segura de tratamentos, visto que a imprecisão na coleta de informa ções sobre o histórico de saúde do usuário gera incertezas. A presença de acompanhante reduz as possibilidades de erro, no entanto limita a autonomia da PcSS em decorrência da sua exclusão do processo de comunicação com o profissional.

Este estudo originou-se da preocupação de enfermeiros pesquisadores em relação a qualidade da consulta a PcSS. Empondera-dos, por meio de estudos desenvolvidos em grupo de pesquisa (2-4, 9-11, 20), a respeito das dificuldades de pessoas com deficiência quanto ao acesso ao direito à integralidade na assistência à saúde, os autores desta pes quisa buscaram compreender as dificuldades de profissionais da saúde para a realização da consulta ao surdo.

Desta forma, esperamos contribuir incen tivando os cursos de graduação a ampliarem as discussões a respeito da consulta a PcSS e incorporarem a disciplina de Libras na grade curricular. Esperamos, também, contribuir para a melhoria do processo de integraliza-ção da PcSS nos serviços e capacitar novos enfermeiros para uma assistência mais gene ralista, que inclua o surdo, servindo de inspi ração para que outros cursos da área de saú de adotem a mesma estratégia na formação de recursos humanos.

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Recebido: 10 de Abril de 2015; Aceito: 30 de Novembro de 2016

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