INTRODUÇÃO
Planejamento Antecipado de Cuidados (ACP) é uma abordagem que permite aos indivíduos definir, discutir e documentar, juntamente com membros da família e profissionais de saúde, seus objetivos e preferências em relação aos cuidados e tratamentos médicos futuros1. Estudos demonstram que o ACP propicia a otimização da qualidade dos cuidados de fim de vida, a oferta de cuidados em concordância com as preferências do paciente e o aumento da utilização dos Cuidados Paliativos (CP), acarretando redução de custos relacionados aos cuidados de fim de vida; e principalmente, a documentação das Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV)2-4.
Nesse sentido, a Atenção Primária à Saúde (APS) possui características que facilitam esse processo de comunicação com os pacientes e famílias, como a longitudinalidade, por exemplo. Essas características permitem uma maior interação entre a equipe e os pacientes, possibilitando um conhecimento ampliado que vai além da fisiopatologia, alcançando o contexto sociocultural, económico e familiar, facilitando assim a identificação de pacientes elegíveis para o ACP e sua aplicação5. Além disso, a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) recomenda em suas diretrizes a prestação de serviços a pacientes em CP inseridos nos territórios cobertos pelas equipes da APS, sendo essa a população que mais se beneficia do ACP6,7.
No entanto, foram identificadas barreiras que dificultam a aplicação do ACP pelos profissionais de saúde. Entre elas, destaca-se o desconforto dos profissionais em discutir sobre morte e morrer. Estudos mostram que os profissionais entendem a morte como algo difícil de aceitar, ainda mais discutir sobre esse assunto em clínicas e centros de saúde que são vistos como lugares de cura, em que tratamentos não curativos são malvistos. Além disso, a cultura geral da morte como "tabu" complica a comunicação sobre cuidados de fim da vida com pacientes e famílias8,9.
A compreensão sobre a morte e o morrer e o medo que é associado a ela pelos profissionais pode estar ligado aos aspectos culturais e espirituais que permeiam a vida desses profissionais10. Segundo Viktor Frankl, neurologista e psiquiatra vienense, em sua ontologia dimensional, o homem possui três dimensões e uma delas é a dimensão noética, que seria a dimensão espiritual, na qual estão incluídos os valores e a consciência do indivíduo. E essa dimensão direciona, segundo Frankl, as decisões do ser11. O exercício da espiritualidade é frequentemente praticado por meio da religiosidade, ou seja, por meio das crenças religiosas. Atualmente, a religiosidade pode ser medida através do conceito de atitude, que pode ser definido como um conjunto de comportamentos, conhecimentos e afetos relacionados a um objeto chamado religião11.
De acordo com a Logoterapia, uma linha psicoterapêutica e filosófica desenvolvida pelo neurologista vienense, a força motriz do ser humano é o sentido da vida. O sentido da vida impulsiona as decisões que o indivíduo toma diante dos desafios que a vida impõe. E nessa diretriz, o sentido da morte, para Frankl, é um catalisador na busca pelo sentido da vida, devido à irrecuperabilidade que confere à vida e sua inevitabilidade, fazendo com que o ser humano busque preencher o intervalo entre o nascimento e a morte com um sentido para sua vida12. Nesse ínterim, segundo Frankl12, o aspecto espiritual (dimensão noética) e as atitudes religiosas influenciam a compreensão do sentido da vida e da morte pelos seres humanos13. A influência das atitudes religiosas na compreensão do processo de morte e morrer é comprovada por estudos que destacam que a compreensão que os pacientes demonstram sobre a morte, levando em conta esses aspectos, está associada à adesão ao ACP/DA ou não14,15.
Como o ACP é uma abordagem importante para pacientes em CP e o contexto da APS é um ambiente favorável para sua aplicação; e considerando que enfermeiros e médicos são os principais profissionais envolvidos nos cuidados nessa esfera, seria importante entender como esses profissionais compreendem essa ferramenta e seu uso na prática. Considerando ainda que as atitudes religiosas influenciam o sentido da vida e da morte, e a adesão ao ACP/ DA, torna-se relevante entender se esses fatores também influenciam a percepção dos profissionais sobre o tema.
À vista disso, o presente estudo objetivou avaliar a relação entre conhecimento sobre dire-trizes antecipadas de vontade, sentido da vida e atitude religiosa na perspectiva de médicos e enfermeiros da APS.
MATERIAL E MÉTODOS
Delineamento do Estudo: Trata-se de um estudo transversal analítico, que buscou relação entre variáveis de caracterização dos participantes com o conhecimento acerca da DAV, o sentido da vida (busca e presença) e as atitudes religiosas.
Contexto: O estudo foi realizado em serviços de APS de dois munícipios brasileiros, selecionados por conveniência dos pesquisadores, visto que as localidades escolhidas representam as áreas de atuação profissional das autoras, facilitando o acesso e a viabilidade logística para a realização das entrevistas, além de proporcionar um entendimento mais profundo do contexto local e das práticas de saúde na APS desses municípios. Essas localidades serão denominadas por Município A (123.281 mil habitantes) e Município B (21.267 mil habitantes).
Composição da amostra: As unidades de análise do estudo são os médicos e enfermeiros atuantes na APS dos dois municípios. Foram considerados esses profissionais para constituição do universo de participantes, devido sua posição estratégica no sistema de saúde brasileiro, onde desempenham um papel fundamental na coordenação e continuidade do cuidado, além de estarem frequentemente envolvidos em discussões sobre cuidados de fim de vida devido à sua proximidade e vínculo longitudinal com os pacientes7, o que facilita a aplicação e o respeito às DAV. Os critérios de inclusão utilizados foram: profissionais de saúde (médicos e enfermeiros) atuantes na APS dos dois municípios há pelo menos seis meses, maiores de 18 anos de idade. E os critérios de exclusão foram: profissionais em período de licença médica e/ou férias no período de realização das entrevistas. O universo, ou seja, o total de profissional que atuavam em cada município era de 104 profissionais no município A e 19 no município B, totalizando 123 profissionais entre médicos e enfermeiros.
Foram entrevistados 55 enfermeiros (89,43%), desses 43 eram do Município A (78,18% dos enfermeiros) e 12 do Município B (21,82%); e 55 médicos (85,93%), desses 47 eram do Município A (85,45% dos médicos) e 8 do Município B (14,55%), em que o total correspondeu a 92,43% do universo. Os 13 profissionais restantes se recusaram a participar da pesquisa.
Não houve necessidade de substituição de participantes, uma vez que todos os indivíduos que atenderam aos critérios de inclusão e aceitaram participar foram entrevistados conforme planejado, garantindo a integridade e a representatividade da amostra perante o total de profissionais.
Instrumento de coleta de dados: O formulário aplicado continha quatro partes, e não houve teste piloto antes de sua aplicação:
- Caracterização sociodemográfica e profissional: sexo, idade, categoria profissional, município, setor de trabalho, se possui pós-graduação e tempo de atuação no município.
- Questionário sobre conhecimento e atitudes em relação à DA: trata-se do conhecimento prévio dos participantes sobre DA usando escalas dicotómicas e do tipo Likert, nas quais são apresentados valores de 0 a 10 para cada pergunta. O instrumento possui 12 perguntas e foi adaptado para o contexto brasileiro por Stolz et al.16, baseado no questionário validado publicado por Simón-Lorda (Aquino et al.17).
- Questionário de Sentido na Vida (QSV): desenvolvido por Steger et al.18 e adaptado para o contexto brasileiro por Aquino et al.17. O questionário possui dez itens que distinguem duas dimensões: busca de sentido e presença de sentido na vida. Cada item é avaliado usando uma escala Likert de 7 pontos, com 1 correspondendo a "Absolutamente Falso" e 7 a "Absolutamente Verdadeiro". Assim, os escores para cada di-mensão variam de 5 a 35. A primeira dimensão permite avaliar o processo de busca pelo sentido da vida. A segunda, presença de sentido na vida, visa verificar a existência de sentido na vida dos participantes19.
- Escala de Atitude Religiosa-20 (RAS-20): consiste em vinte itens e abrange quatro domínios distintos da religiosidade, a saber: cognitivo, afetivo, comportamental e corporeidade20. Para respondê-la, o participante usa uma escala de cinco pontos, com extremos 1 (NUNCA) e 5 (SEMPRE); com um escore total mínimo de 20 e máximo de 100. A variação de escore para cada domínio é mostrada na Tabela 1. Os escores mais altos nessa escala indicam uma alta atitude religiosa21.
Para garantir a validade dos dados, foram utilizados instrumentos padronizados e validados previamente na literatura. Além disso, procedimentos de validação interna, como a análise da consistência interna através do coeficiente alfa de Cronbach, foram conduzidos para confirmar a confiabilidade dos instrumentos aplicados no contexto do estudo. Os resultados do coeficiente alfa de Cronbach para a nossa amostra indicaram que a EAR-20 possui alta consistência interna (a = 0,88), enquanto o questionário sobre DAV e o QSV apresentam consistência interna aceitável (a = 0,69 e a = 0,51, respectivamente).
Coleta de dados: A coleta de dados ocorreu entre dezembro de 2021 e maio de 2022, por meio de entrevistas presenciais, nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) dos dois municípios.
A ferramenta utilizada para preenchimento do questionário foi o Google Forms, e sua política de privacidade foi mantida. Após a conclusão da coleta de dados, foram emitidas planilhas, que foram arquivadas confidencialmente na posse do pesquisador principal, e que, após cinco anos, serão deletadas.
O estudo implementou um processo de coleta de dados anónimo e confidencial, assegurando que as respostas dos participantes não fossem influenciadas por preocupações sobre julgamentos ou repercussões. Além disso, as entrevistas foram conduzidas de forma padronizada, seguindo um roteiro estruturado para minimizar o viés do entrevistador e garantir a objetividade das respostas. Foram implementadas verificações rigorosas durante a coleta de dados, garantindo que todos os questionários fossem completamente preenchidos pelos participantes, não havendo dados faltantes.
Análise de dados: Os dados foram capturados pelo aplicativo GoogleForms® para verificação e validação. Os instrumentos foram decompostos em componentes para possibilitar a análise entre eles. O questionário de DA foi dividido em: componente de conhecimento; componente de opinião; e componente de recomendação e respeito. O QSV foi dividido em subescala de presença e subescala de busca. O RAS-20 será apresentado em seus quatro domínios: cognitivo, comportamental, afetivo e corporeidade. Esses componentes constituíram as variáveis do estudo.
Inicialmente, foram realizadas análises descritivas e exploratórias de todas as variáveis. Para isso, foram utilizadas frequências absolutas e relativas, médias, desvios padrão, mínimos, máximos e quartis. Testes t de Student e testes de Welch foram utilizados para comparar escores entre dois grupos quando as variâncias eram homogéneas ou heterogéneas, respectivamente. Testes não paramétricos de Kruskal Wallis e Dunn foram utilizados para comparar os três grupos com diferentes níveis de atitude religiosa, em relação aos escores das subescalas de presença e busca do QSV e o componente "Recomendação e respeito" da DAV. Análises de correlação de Spearman(r) foram usadas para analisar correlações entre variáveis. A classificação da força da correlação foi classificada da seguinte forma: muito fraca (0,00-0,19), fraca (0,20-0,39), moderada (0,40-0,69), forte (0,70-0,89) e muito forte (0,90-1,0)22. As análises foram realizadas utilizando o software R Core Team (2020), com nível de significância de 5%.
O estudo apresenta possíveis variáveis de confusão, como: a formação acadêmica e profissional dos participantes, suas experiências pessoais e profissionais prévias com DAV, bem como suas crenças religiosas e culturais, que poderiam influenciar o conhecimento e as atitudes em relação às DAV, interferindo na avaliação dos resultados. No entanto, a fim de minimizá-las as, foi adotado um rigoroso critério de inclusão dos participantes, além de serem aplicados questionários padronizados e validados para avaliar o conhecimento, o sentido da vida e as atitudes religiosas, garantindo assim a consistência e a comparabilidade dos dados coletados. Além disso, foram realizadas análises estatísticas apropriadas para controlar possíveis influências dessas variáveis nos resultados do estudo.
Aspectos éticos: O projeto foi aprovado pelo Comité de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) sob o parecer n° 5.070.511 e foi conduzido de acordo com as normas éticas para pesquisa envolvendo seres humanos. O consentimento informado por escrito foi obtido individualmente de todos os participantes incluídos no estudo.
RESULTADOS
A Tabela 2 apresenta as características dos participantes do estudo.
Quanto ao componente de conhecimento sobre DAV, a maioria (79,1%) dos profissionais afirmou não ter conhecimento, 8,2% adquiriram conhecimento na graduação, 7,3% na pós-graduação, 0,9% em cursos específicos e 4,5% de outra forma, o que pode ser observado na Tabela 3. Além disso, quando perguntados sobre a nota que dariam ao seu conhecimento sobre DA, 71,82% dos participantes atribuíram nota no intervalo de 0-2 a seu conhecimento.
Com relação ao conhecimento sobre a regulamentação legal das DAV no Brasil, 16,4% afirmaram que há regulamentação, 6,4% responderam que não e 77,3% responderam que não sabiam. Quando questionados se já haviam lido algum documento sobre DAV, 10% dos profissionais disseram que já leram e 90% não.
Na Tabela 1 são expressas as médias dos escores dos outros dois componentes do instrumento sobre DAV, do QSV e dos domínios do RAS-20.
Em uma escala que varia de 0 a 10, as médias dos escores dos componentes de opinião dos profissionais sobre DAV foram superiores a 8. Quanto ao componente de recomendação e respeito, a maioria das médias também foi superior a 8,0, com exceção do item "Você acha provável que fará sua declaração de DAV no próximo ano" com média de 5,0 e "Respeitaria os desejos expressos de um paciente em uma declaração de DAV" com média de 7,8.
Em uma escala que varia de 5 a 35 do QSV, a média do escore para presença foi 29,9 e para busca foi 20,5. No RAS-20, a média do escore para o domínio cognitivo foi 20,5, numa escala que varia de 7 a 35. Para comportamental (escala de 5 a 25), a média foi 17,4. Para afetivo, com escala de 3 a 15, a média foi 11,3 e para corporeidade (escala de 5 a 25), a média foi 14,1.
Tabela 3 Conhecimento sobre Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV) em profissionais da área da saúde, Brasil, 2023 (n=110).

Os resultados dos três instrumentos foram comparados em termos do município onde atuavam, e não foram identificadas diferenças significativas.
Quanto à categoria profissional, observou-se que 5,5% dos enfermeiros e 36,4% dos médicos acreditavam ter conhecimento sobre DAV. Em média, enfermeiros e médicos pontuaram 1,8 e 2,9, respectivamente, em seu conhecimento sobre DA. Ambas as variáveis apresentaram diferença significativa (p<0,05).
Como se observa na Tabela 4, houve correlações fracas e significativas entre a subescala Busca do QSV e o desejo de familiares fazerem DAV (p=0,04), e entre a subescala Busca e Atitude Religiosa (p<0,01). A subescala Busca teve escores maiores em grupos com alta Atitude Religiosa. Também houve correlações fracas e significativas entre Atitude Religiosa e a probabilidade de fazer DAV no próximo ano (p=0,03). Não houve diferença significativa entre níveis de Atitude Religiosa e "Recomendação e Respeito" das DAV (p>0,05).
DISCUSSÃO
Os resultados do estudo demonstraram primeiramente, o nível de conhecimento dos profissionais da Atenção Primária quanto a DAV, em que quase 80% dos participantes indicaram não ter conhecimentos sobre o instrumento, atribuindo uma nota média de 2,36 (0-10). Este déficit de conhecimento foi identificado em outros estudos23,24 realizados na Europa e na Ásia com profissionais médicos e enfermeiros. Essa situação pode ser atribuída à formação acadêmica desses profissionais relacionada aos CP, em que a temática não é abordada de maneira robusta nos currículos e consequentemente acabam por não envolver abordagens como o ACP e o instrumento DAV, bem como as discussões de fim de vida25. Outro ponto levantado pelos estudos, é que a falta de leis consolidadas sobre o assunto, acabam por não dar espaço ao ACP e DAV nas esferas de saúde, limitando o acesso tanto dos profissionais, quanto dos pacientes a eles24.
A maioria dos participantes (77,3%) indicou não saber se existe regulamentação legal das DAV no Brasil. O conhecimento acerca da legislação a respeito da DAV é relevante para os profissionais que vão aplicar o ACP com vistas à DAV e ainda mais relevante aos que vão receber esse documento e refletir sobre os desejos do paciente inseridos ali e os procedimentos de saúde que vão ser realizados ou não junto àquele paciente26. Visando tanto o cumprimento da lei e o respaldo legal, mas também o respeito a autonomia do paciente27,28.
A pontuação relacionada ao componente Recomendação e Respeito variou de 7,8 a 8,0 (sendo o máximo 10). Ou seja, mesmo demonstrando déficit de conhecimento acerca do tema, os participantes concordam com a essência do instrumento DAV de autonomia do paciente e concordam em recomendá-lo e respeitá-lo, e este achado está em concordância com estudos em diferentes países com as mesmas classes profissionais23,29,30. Assim, é possível perceber que as barreiras de aplicação do ACP e DAV não estão fundamentadas às ideologias que embasam esses instrumentos, mas sim na escassez do conhecimento e prática acerca das abordagens30.
Uma das correlações significativas evidenciadas pelo estudo, foi a que relaciona a subescala Busca do QSV com a Recomendação de DAV aos familiares. A subescala Busca, pode se relacionar com a busca de sentido, que é a motivação incessante do indivíduo que surge após alcançar objetivos13, mas também pode se relacionar com contextos estressantes que impulsionam o indivíduo a adaptação e à resiliência31. A correlação desse constructo com a recomendação de DAV a familiares pode implicar em uma estratégia do indivíduo para evitar o sofrimento dos entes queridos, visto que altas pontuações na subescala Busca também estão associadas a sentimentos negativos e depressão19,32, e um dos benefícios da DAV é evitar a futilidade terapêutica e a distanásia33,34.
Destaca-se também a correlação positiva entre a Atitude Religiosa (Total, Componente Cognitivo e Componente Comportamental) com a afirmativa de "Fazer sua DAV no próximo ano". De acordo com Geertz34, dar sentido a experiência vivida é tão importante para o ser humano quanto suas necessidades biológicas, assim a religião ultrapassa a esfera metafísica induzindo a aceitação intelectual e reforçando o compromisso emocional. Dessa forma, a atitude religiosa pode ser expressa como o ato de possuir uma crença e através dela encontrar sentidos na vida e assim ser conduzido para uma cosmovisão mais positiva35. Considerando que estudos apontam que pessoas que apresentam crenças religiosas tem mais probabilidade de iniciar discussões sobre ACP e conversas sobre a terminalidade da vida36,37, a correlação encontrada pode ser compreendida como a habilidade da pessoa que apresenta crenças religiosas traçar planos para o futuro, sem considerar a possibilidade de morte como algo extremamente negativo, visualizando a DAV como uma ação organizacional de algo inevitável.
Uma das limitações que recaem sobre o estudo é a seleção por conveniência dos participantes, o que pode introduzir vieses e limitar a representatividade da amostra, restringindo a generalização dos resultados para outras regiões ou contextos. Além disso, a natureza transversal do estudo impede a inferência de causalidade entre as variáveis analisadas. Portanto, futuros estudos com amostras maiores e mais diversas, bem como delineamentos longitudinais, são necessários para corroborar e expandir os achados aqui apresentados.
CONCLUSÕES
Os resultados deste estudo indicam que os profissionais de saúde da APS apresentam um conhecimento limitado sobre DAV, o que pode ser influenciado não só pela formação insuficiente, mas também por fatores culturais, como crenças religiosas e o sentido da vida. No entanto, essa lacuna de conhecimento deve ser vista no contexto mais amplo do sistema de saúde e da forma como a regulamentação nacional é traduzida em orientações práticas e educação continuada.
A falta de informações detalhadas sobre as políticas de fim de vida do Brasil não significa necessariamente que os profissionais estejam despreparados para iniciar conversas sobre esses tópicos. Existem outras abordagens eficazes que podem ser utilizadas na promoção do ACP, considerando as influências culturais e religiosas.
Recomenda-se que futuras pesquisas explorem diferentes estratégias para integrar as DAV na prática clínica da APS e desenvolvam programas de formação contínua que abordem tanto as diretrizes legais quanto os aspectos culturais e religiosos, promovendo um ambiente onde os profissionais de saúde se sintam preparados e apoiados para conduzir discussões sobre cuidados de fim de vida com seus pacientes