INTRODUÇÃO
A tecnologia educacional é considerada uma ferramenta importante para a realização do trabalho educativo, capaz de auxiliar na construção de conhecimentos, de modo que, quando utilizada pela enfermagem, apresenta-se eficaz no processo de educação em saúde1. No que se refere ao uso das tecnologias educacionais pelo enfermeiro no contexto da educação em saúde com a comunidade, algumas modalidades podem ser utilizadas, sendo estas as tecnologias educacionais audiovisuais, impressas, dialogais e expositivas1,2.
Considerando as diversas possibilidades de tecnologias que podem ser aplicadas, e analisando a preferência dos usuários com relação ao estilo de aprendizagem, pode-se destacar o uso dos materiais educativos impressos, considerados ferramentas importantes de educação em saúde, utilizados para facilitar o conhecimento e esclarecer mitos relacionados a diferentes temas3. Sob essa ótica, observa-se o uso crescente de cartilhas educativas no contexto da saúde, visto que este é um material que pode auxiliar em orientações fornecidas, o que pode promover maior autonomia para o paciente, visto que o indivíduo poderá consultar as informações da cartilha no ambiente domiciliar em caso de dúvidas, sendo uma fonte de informações também para outros familiares ou pessoas com quem tem convívio4.
No entanto, é importante considerar que para que os materiais educativos sejam utilizados de forma efetiva, é essencial que os profissionais de saúde também tenham contato com o indivíduo, de modo a estabelecer um vínculo de confiança, e possibilitar a realização de aconselhamentos voltados para a promoção da saúde, abordando sobre comportamentos que são capazes de proporcionar melhor qualidade de vida da população e contribuir para o empoderamento dos pacientes no que se refere à tomada de decisões sobre a saúde dos mesmos5. Para isso, a entrevista motivacional pode representar uma técnica a ser utilizada na prática profissional, com intuito de possibilitar uma melhor formação de vínculo entre profissional e paciente, e como forma de otimizar a comunicação e promover adesão ou mudança comportamental6.
Dessa forma, pode-se destacar que a entrevista motivacional e a cartilha educativa são estratégias educativas que podem ser utilizadas de forma isolada, ou seja, somente uma tecnologia é aplicada com o indivíduo, de modo que a utilização dessas de forma individual pode representar bons resultados, promovendo maior adesão ou melhora da prática, conhecimento e atitude dos pacientes sobre determinada temática, como a da diarreia infantil7. Entretanto, estudos demonstram que associações entre essas duas tecnologias educativas são capazes de apresentar maior eficácia no alcance dos objetivos almejados, além de contribuir para otimizar os resultados encontrados após as intervenções, como aumento da autoeficácia de participantes e diminuição de casos de diarreia em crianças8,9.
Desse modo, considerando a importância do enfermeiro nos diversos processos de saúde/ doença e analisando os benefícios da utilização das tecnologias educativas no contexto da educação em saúde, o enfermeiro pode utilizar essa importante ferramenta como aliada em diferentes contextos da assistência, de maneira isolada ou associada, visando contribuir não somente para otimizar a adesão a determinado regime terapêutico, como também no contexto da prevenção e manejo adequado de doenças prevalentes na infância, como a diarreia.
A diarreia é responsável por um elevado índice de mortes em crianças no mundo, configurandose como sendo um importante problema de saúde pública, de modo que, embora os números de casos e mortes ocasionadas por diarreia venham sendo diminuídos ao longo dos anos, mundialmente esse agravo ainda é a segunda causa de morte em crianças menores de cinco anos10. Somado a isso, destaca-se que durante o ano de 2019, no Brasil, foram registrados 118.286 casos de internação por diarreia, destes 27, 98% eram referentes à internação de indivíduos com menos de cinco anos de idade11.
Dentro desse contexto, é importante destacar que a diarreia é uma doença que pode ser prevenida e tratada, e a elaboração e utilização de tecnologias educacionais pode ser considerada como uma importante ferramenta de empoderamento de pais e/ou cuidadores no que concerne aos cuidados associados à prevenção dos casos de diarreia, visto que esses são os principais responsáveis pelos cuidados ofertados ao público infantil, e necessitam ter a habilidade, confiança e conhecimento adequados para garantir um cuidado apropriado e suprimento das principais necessidades das crianças9. Por isso, é importante que os cuidadores desenvolvam autoeficácia adequada para prevenir a diarreia em crianças8.
A autoeficácia é definida como a confiança de um indivíduo na realização de ações consideradas necessárias para se atingir determinado resultado, de modo que conforme a autoeficácia é alcançada, o indivíduo apresenta uma motivação maior para a mudança de comportamento e consequente melhora no padrão dos cuidados associados à promoção da saúde12.
Desse modo, compreendendo a diarreia como um agravo capaz de comprometer consi deravelmente a saúde da criança, é essencial que sejam implementadas estratégias com intuito de preveni-la, especialmente por reconhecer que ações e cuidados simples podem contribuir para redução da sua ocorrência, sendo imprescindível que sejam realizadas intervenções e atividades de educação em saúde que busquem aumentar a autoeficácia de mães, cuidadores e familiares na realização de cuidados para a prevenção e manejo diante da identificação de casos de diarreia. Nesse contexto, a enfermagem possui papel fundamental, visto que o enfermeiro é um dos profissionais que realizam o acompanhamento periódico da saúde infantil e fornece orientações diversas relacionadas à saúde.
Assim, o estudo baseou-se no seguinte questionamento: Uma intervenção educativa baseada na leitura da cartilha educativa 'Você é capaz de prevenir a diarreia no seu filho!'13 combinada com uma Entrevista Motivacional Breve (EMB) será capaz de elevar a autoeficácia materna das participantes em prevenir a diarreia infantil e diminuir os episódios diarreicos em crianças?
O presente estudo tem como objetivo avaliar o efeito do uso de cartilha educativa combinada com uma EMB sobre autoeficácia materna na prevenção da diarreia infantil e ocorrência de episódios diarreicos em crianças.
MATERIAL E MÉTODO
Trata-se de uma pesquisa quase experimental, do tipo antes e depois, com grupo único. Os estudos quase experimentais envolvem a aplicação de uma intervenção, de modo que cada participante atua como seu próprio controle14. Assim, destaca-se que o presente estudo apresentou como intervenção a aplicação da cartilha educativa "Você é capaz de prevenir a diarreia no seu filho!"13, associada a uma EMB, visando a promoção da autoeficácia materna na prevenção da diarreia infantil.
O estudo foi realizado em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) do município de Redenção/ CE, Brasil. A fase da coleta de dados ocorreu de janeiro a abril de 2022. A população do estudo foi composta por mães de crianças menores de cinco anos de idade. No que se refere ao cálculo para determinação da amostra do estudo, utilizou-se uma fórmula baseada no teste qui-quadrado de McNemar15. Assim, adotou-se a fórmula, nP= (Za/2+2.Z|3.Vpa.qa)2/4.pd.(pa - 0,5)2, em que o cálculo amostral apresentou como resultado o número de 50 participantes.
A amostra da pesquisa se deu por conveniência, no qual possíveis participantes que compareciam na UBS foram convidadas a participar da pesquisa. Adotou-se para o estudo os critérios de inclusão: ser mãe de criança menor de cinco anos de idade, acompanhada e cadastrada na UBS onde foi desenvolvido o estudo, ter mais de 18 anos de idade, ser alfabetizada, e possuir número de telefone ativo. Adotou-se como critérios de exclusão: mães que não possuíam contato telefónico, mães que não tinham a habilidade cognitiva necessária para realização da leitura da cartilha educativa e mães cujas crianças apresentassem alguma patologia que possuísse relação direta com a ocorrência de episódios diarreicos. Elencou-se também para a pesquisa critérios de descontinuidade, sendo estes compostos por participantes nos quais não foi possível realizar contato telefónico nas etapas posteriores referentes à coleta de dados.
A coleta de dados ocorreu em três etapas, sendo estas: 1) Pré-teste, composto pela aplicação do questionário do perfil sociodemográfico e da Escala de Autoeficácia Materna para Prevenção da Diarreia Infantil (EAPDI)16; 2) Intervenção educativa com aplicação da cartilha educativa seguida de entrevista motivacional breve e segunda aplicação da EAPDI; 3) Pós-teste, realizado por meio da aplicação da EAPDI e do Formulário de investigação da ocorrência de casos de diarreia por contato telefónico, um mês após a intervenção educativa16,17.
Na etapa 1, para o início da coleta de dados, primeiramente a pesquisadora abordou as participantes para analisar se as mesmas atendiam aos critérios de inclusão elencados, e para explicar os objetivos da pesquisa. Então, as participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e, posteriormente, aplicou-se a EAPDI e um questionário para levantamento do perfil sociodemográfico da população.
Destaca-se que a EAPDI é uma escala do tipo likert, já validada previamente, e que avalia o nível de autoeficácia das mães com relação às habilidades destas em prevenir a diarreia infantil, sendo composta por 24 itens, divididos entre o domínio definido como higiene da família (15 itens) e o domínio práticas alimentares (9 itens). O instrumento possui padrões de resposta que podem variar de 1 (que representa a resposta discordo totalmente) a 5 (que significa concordo totalmente)16.
Na segunda etapa foi realizada a intervenção educativa, em que foi utilizada a cartilha educativa "Você é capaz de evitar a diarreia no seu filho!"13, elaborada com base na teoria da Autoeficácia de Bandura, e validada por juízes especialistas na temática e em design e mães de crianças menores de cinco anos de idade. A cartilha utilizada contém 32 páginas, divididas em oito tópicos, sendo estes: I. Como saber se a criança está com diarreia; II. Como cuidar da higiene do seu filho; III. Saiba como cuidar da sua higiene; IV. A limpeza do ambiente ajuda a prevenir doenças; V. Vamos aprender a lavar as frutas e as verduras; VI. Veja como cuidar da alimentação do seu filho; VII. Saiba a importância da vacinação para seu filho; VIII. Como cuidar da criança com diarreia13.
Vale ainda ressaltar que, conforme citado anteriormente, a cartilha educativa utilizada foi validada com juízes de conteúdo, juízes técnicos e com a população-alvo, de modo que os juízes de conteúdo atribuíram um Índice de Validade de Conteúdo (IVC) de 0,88 para clareza da linguagem; 0,91 para pertinência prática e 0,92 para relevância teórica. Os juízes técnicos atribuíram um IVC de 0,96; 1,00 e 1,00 para os mesmos itens, respectivamente. Com a população-alvo obteve-se um IVC global de 0,99 no que se refere a relevância do material educativo18. A cartilha também foi aplicada em outras pesquisas com populações semelhantes à do presente estudo8,9.
Além disso, como parte da intervenção educativa, realizou-se uma EMB, baseada na Teoria da Autoeficácia de Bandura19. Considerando que a entrevista motivacional é desenvolvida através da identificação das necessidades de cada participante, não se torna possível adotar um esquema rígido e imutável para a sua execução. Entretanto, obedeceu-se aos passos básicos para sua implementação, sendo estes: I. Aproximação, apresentação e permissão; II. Informação; III. Evocação inicial; e IV. Evocação final9.
Desse modo, no que concerne à implementação da intervenção educativa, cada participante foi convidada a permanecer em uma sala reservada e realizar a leitura completa da cartilha "Você é capaz de prevenir a diarreia no seu filho!". Nesse momento, a pesquisadora ficou responsável por observar discretamente se a mãe estava realizando a leitura do material, além de disponibilizar-se a sanar as possíveis dúvidas que pudessem surgir. Após finalizar a leitura da cartilha, a mãe participou de uma EMB, realizada pela pesquisadora, com intuito de esclarecer as principais dúvidas das participantes, com auxílio da cartilha utilizada na fase anterior, e visando trabalhar a motivação das mesmas para melhora da autoeficácia das mães em prevenir a diarreia infantil.
Imediatamente após a intervenção, a EAPDI foi aplicada novamente com o objetivo de analisar o efeito da leitura da cartilha e da realização da EMB sobre a autoeficácia das mães em prevenir a diarreia infantil.
A terceira etapa foi realizada com o intuito de melhor analisar o efeito da intervenção a longo prazo, as participantes foram acompanhadas através de contato telefónico, 30 dias após a intervenção.
Nessa etapa, aplicou-se novamente a EAPDI e o formulário que investiga a ocorrência dos casos de diarreia nos últimos 30 dias. O referido formulário foi desenvolvido por Joventino17 e investiga, por meio de contato telefónico, a ocorrência de diarreia infantil no último mês. O instrumento é composto por quatro itens, sendo estes: dia em que a diarreia iniciou; dia em que a diarreia terminou; características das fezes e quais cuidados ou ações a mãe ou cuidador realizaram quando a criança estava com diarreia17. Desse modo, por meio da análise, as participantes do estudo foram avaliadas antes, imediatamente depois e um mês após a aplicação da intervenção, de modo que foi analisada a média dos escores de autoeficácia das mães em prevenir a diarreia infantil, assim como foi analisado a ocorrência do agravo antes e um mês após a intervenção educativa.
Após a concretização da etapa referente à coleta, os dados obtidos foram digitados no Microsoft Excel 2010 e analisados através do programa Statistical Package for the Social Sciences (IBM SPSS Statistics), em sua versão 20.0, de forma que foram utilizados como testes estatísticos o Teste de Friedman e Teste Q de Cochran, para comparar os escores da EAPDI ao longo do estudo, e os testes de Shapiro-Wilks e McNemar para comparar a diferença de proporção entre a ocorrência de diarreia antes e após a aplicação da intervenção. De acordo com a aplicação da EAPDI, as participantes foram consideradas com baixa/moderada autoeficácia em prevenir a diarreia infantil (escores < 114 pontos) ou elevada autoeficácia (escores > 115 pontos)16. Considerou-se para a análise dos dados um intervalo de confiança de 95% e um valor de p< 0,05.
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira, sob número de parecer 4.327.066.
RESULTADOS
Participaram do estudo 50 mães de crianças menores de cinco anos, submetidas à aplicação da EAPDI, à intervenção referente à leitura da cartilha educativa e à realização da EMB com a pesquisadora. No decorrer da pesquisa 15 participantes enquadraram-se nos critérios de descontinuidade estabelecidos previamente, devido à impossibilidade de contato telefónico com as mães para conclusão da terceira etapa do estudo, correspondente à aplicação da EAPDI. Logo, a amostra final foi de 35 participantes.
No que se refere à caracterização das participantes em relação aos dados sociodemográficos, obteve-se idade média de 27,5 (±5,9) anos, 22 possuía como grau de escolaridade o ensino médio (62,9%), 21 apresentava como principal ocupação ou profissão o cuidado do lar (60%), 26 participantes tinham renda familiar de até um salário-mínimo (74,3%), 27 mães participantes tinham de 1 a 2 filhos (77,1%) e um total de até 5 pessoas na residência (77,1%). Com relação ao estado civil, 17 participantes (48,6%) eram solteiras e as demais eram casadas ou estavam em união estável.
Com o intuito de identificar o impacto da intervenção sobre a autoeficácia materna em prevenir a diarreia infantil, analisou-se a média da autoeficácia antes, imediatamente depois, e após o período de 30 dias de aplicação da intervenção educativa. A Tabela 1 apresenta os valores obtidos em cada uma dessas etapas.
Desse modo, os valores da escala total obtidos antes e imediatamente após a intervenção demostraram que houve um ganho de 3,0 pontos na média dos referidos escores de autoeficácia. No que se refere à média de autoeficácia antes e 30 dias após a intervenção, nota-se um aumento de 3,52. Desse modo, quando comparados os momentos de avaliação, identifica-se um aumento de autoeficácia materna em prevenir a diarreia infantil ao longo do estudo, com diferença estatisticamente significativa em todos os momentos analisados (p< 0,001).
Com relação à análise dos domínios e à comparação dos valores obtidos no decorrer do estudo, detectou-se que no domínio higiene da família houve um ganho de 2,14 em comparação aos escores obtidos antes da intervenção e imediatamente após esta, de modo que este valor aumentou 2,34 um mês após a intervenção, quando comparado ao pré-teste (p< 0,001). No domínio de práticas alimentares/gerais observou-se um ganho de 0,83 imediatamente após a intervenção em relação ao valor obtido antes desta, com um aumento de 1,15 no pós-teste após um mês em comparação ao valor obtido antes da intervenção (p= 0,002), de modo que estes valores foram considerados estatisticamente significantes.
Assim, a partir da avaliação dos escores totais e dos domínios da EAPDI, nota-se que a intervenção foi efetiva para a elevação da autoeficácia materna em prevenir a diarreia infantil, com aumento mais acentuado 30 dias após a realização da intervenção.
Além disso, com intuito de melhor avaliar o efeito da intervenção educativa, analisou-se os níveis de autoeficácia materna em prevenir a diarreia infantil também no pré-teste e pós-teste (imediato e um mês após a intervenção). A Tabela 2 apresenta os valores correspondentes a cada momento da coleta de dados.
Os dados apresentados na Tabela 2 sinalizam um aumento no número de mães que apresentaram elevada autoeficácia ao longo das etapas do estudo, com aumento do número de mães que passaram a apresentar elevada autoeficácia em prevenir a diarreia infantil, sendo esses valores considerados estatisticamente significantes (p< 0,001).
Assim, de forma geral, detectou-se uma elevação dos níveis de autoeficácia no escore total e nos domínios práticas alimentares/gerais e higiene da família, sendo este aumento diretamente associado ao aumento do número de participantes que passaram a apresentar elevada autoeficácia nas etapas do estudo, de forma que este resultado se apresentou diretamente associado ao efeito benéfico da intervenção educativa.
Para avaliar a eficácia da intervenção educativa na ocorrência dos casos de diarreia, foi realizada a análise da ocorrência da doença um mês antes e após a aplicação da intervenção. Na Tabela 3 podese observar o impacto da intervenção educativa sobre a ocorrência de casos de diarreia infantil em crianças menores de cinco anos.
Conforme mostra a Tabela 3, percebe-se uma redução no número de episódios de diarreia apresentados pelas crianças das mães que participaram do estudo, em comparação com o número de episódios diarreicos apresentados antes da intervenção. Destaca-se que o número de episódios de diarreia identificados antes e após a intervenção podem corresponder ou não a mesma criança, de forma que no presente estudo essa distinção não foi considerada.
Nesse contexto, vale salientar que o uso da cartilha educativa "Você é capaz de prevenir a diarreia no seu filho!" associada a EMB auxiliou no aumento da autoeficácia materna no que se refere à realização dos cuidados executados pelas mães para a prevenção da diarreia infantil e demonstrou ser uma ferramenta eficaz para a diminuição da ocorrência de casos de diarreia infantil em crianças menores de cinco anos.
DISCUSSÃO
Ao definir a autoeficácia como um importante preditor de comportamentos promotores de saúde e de cuidados relacionados aos indivíduos, é importante o deslocamento da atenção à saúde restrita ao adoecimento, para o acolhimento de condições de vida e histórico dos usuários, de modo que para que a abordagem da promoção da saúde ocorra de forma efetiva, é necessário o desenvolvimento de tecnologias e políticas públicas com intuito de favorecer, de forma participativa e compartilhada, a produção e disseminação de conhecimentos relacionados às práticas de saúde19,20. Nesse contexto, os usos das tecnologias educativas pelos profissionais da saúde, incluindo os enfermeiros, estão sendo cada vez mais utilizados com intuito de incentivar e promover orientações adequadas na manutenção de cuidados.
É possível observar que, no contexto da saúde infantil, realizam-se amplos estudos com intuito de elevar a autoeficácia materna. Um estudo quase-experimental que avaliou o efeito da aplicação de intervenção educativa por meio de serviços de mensagem multimídia na promoção da autoeficácia para realização de exercício físico em pacientes com diabetes mellitus tipo 2, detectou presença de autoeficácia mais elevada nos participantes do grupo que recebeu a intervenção educativa, de forma que esta foi considerada efetiva na promoção de mudanças de hábitos e comportamentos relacionados à atividade física dos pacientes21.
No que concerne à prevenção da diarreia infantil, muitos estudos foram desenvolvidos com a finalidade de elaborar, validar e aplicar tecnologias educativas para aumentar a autoeficácia de mães na realização de ações e cuidados importantes para evitar a ocorrência de episódios diarreicos8,9,13,18,22.
Assim, através da análise dos resultados do presente estudo, observou-se que houve um aumento na média dos escores de autoeficácia materna em prevenir a diarreia infantil na EAPDI em comparação aos momentos antes, imediatamente após e um mês após a realização da intervenção. Tais resultados possibilitam a observação de que a utilização e associação de tecnologias educativas, como cartilhas educativas e a realização de entrevista motivacional breve, podem contribuir para a prevenção de posteriores episódios de diarreia infantil, e são capazes de proporcionar o aumento da confiança dos pais em realizar cuidados importantes associados às crianças.
Sob esse aspecto, destaca-se que a utilização da Entrevista Motivacional representa uma intervenção importante no contexto do cuidado em saúde. Ensaio clínico randomizado realizado com 57 participantes, com o objetivo de avaliar a efetividade da aplicação de Entrevista Motivacional sobre o estado de saúde de pacientes que realizavam hemodiálise, demostrou que a aplicação da intervenção mostrou-se como uma técnica de baixo custo, capaz de ser utilizada por profissionais capacitados, e apresentou-se como efetiva na melhora do autocuidado e da saúde em geral, incluindo melhora nos índices de ansiedade e depressão dos pacientes na pesquisa23.
Corroborando também com os achados da presente pesquisa, pode-se salientar que estudos que utilizam como intervenção a aplicação de tecnologias educativas baseadas na teoria da Autoeficácia de Bandura apresentam resultados benéficos no que se refere à elevação da autoeficácia dos participantes. Nesse contexto, pode-se citar um estudo clínico de viabilidade, que buscou avaliar o efeito de intervenção interprofissional breve pautada de acordo com a Teoria da Autoeficácia de Bandura sobre a incidência, manejo e intensidade da dor em 25 pacientes portadores de dor crónica com etiologias variadas, de forma que verificou-se que a intervenção gerou resultados favoráveis relacionados ao aumento da autoeficácia no manejo da dor crónica, e contribuiu para a redução da incapacidade associada à dor e à fadiga nos participantes24.
Ademais, é necessário destacar sobre o aumento nos escores totais dos níveis de autoeficácia e a respectiva comparação com os valores obtidos nos domínios correspondentes da EAPDI, onde verificou-se um maior aumento nos valores referentes ao domínio higiene da família. Resultados semelhantes foram encontrados no estudo brasileiro que utilizou abordagem semelhante ao do presente estudo, no entanto com público e local diferentes, em que abordou sobre a aplicação da cartilha educativa 'Você é capaz de prevenir a diarreia do seu filho!' associada a entrevista motivacional breve em um ensaio clínico randomizado, onde identificou-se que houve um aumento nos escores gerais associados à autoeficácia e um ganho maior no domínio higiene da família se comparado ao ganho relacionado ao domínio práticas alimentares, sendo os resultados associados diretamente ao efeito benéfico das intervenções educativas realizadas9.
Ademais, ao verificar-se os casos de diarreia infantil na presente pesquisa, identificou-se que em um período de um mês, das 35 mães que participaram da pesquisa, 13 relataram que seus filhos tiveram diarreia, correspondendo a uma porcentagem de 37,1%, sendo bastante expressivo, mesmo considerando-se o público pequeno analisado. Diante do exposto, verifica-se que os achados do presente estudo corroboram com dados da literatura, ressaltando que embora os casos de diarreia infantil tenham diminuído ao longo dos anos, os índices de ocorrência e morbimortalidade infantil causada por essa afecção ainda retrata uma taxa de casos preocupante10.
Sabe-se também que medidas simples podem ser tomadas para prevenir esses casos, podendo-se citar a promoção ao aleitamento materno, o seguimento do calendário vacinal atualizado, o uso de água potável para o consumo e preparo dos alimentos, a higienização das mãos e ambiente, assim como dos utensílios utilizados para preparação da alimentação da criança25.
Nesse contexto, os resultados deste estudo demostraram que houve um número significativo de crianças que já apresentaram algum caso da doença antes da aplicação da intervenção educativa. Em consonância com esse achado, ensaio clínico randomizado realizado na cidade de Fortaleza/CE, mostrou que mais da metade dos filhos das mães participantes do estudo já havia apresentado pelo menos um episódio da doença8.
Em relação ao acompanhamento das mães, após um mês de intervenção educativa percebeu-se que houve aumento no quantitativo de participantes com elevada autoeficácia em prevenir a diarreia e diminuição na ocorrência da diarreia nas crianças, quando comparada ao mês anterior à intervenção, sendo possível inferir que o uso de cartilha educativa juntamente com a EMB é uma ferramenta eficaz no aumento da confiança materna e na prevenção da diarreia infantil.
Corroborando com o achado exposto acima, ensaio clínico brasileiro, realizado com dois grupos intervenção, onde também aplicou em um dos grupos, cartilha educativa associada a EMB e no outro grupo vídeo e EMB, foi visto que a autoeficácia materna em prevenir a diarreia infantil um mês após a intervenção foi maior no grupo cartilha associada a EMB quando comparada ao grupo em que utilizou vídeo e EMB. Outro achado importante desse estudo foi que após dois meses da intervenção os dois grupos apresentaram redução na ocorrência de casos de diarreia em crianças menores de cinco anos8.
Com relação aos aspectos sociodemográficos, observou-se no presente estudo, maior prevalência de participantes com renda familiar de até um salário mínimo e que possuíam o ensino médio como nível de escolaridade. Assim, é importante considerar que os determinantes sociais de saúde, tais como, baixa escolaridade e menor renda familiar, prevalentes em determinados grupos da população, podem influenciar diretamente na ocorrência de casos da doença26.
Desse modo, vale ainda destacar que intervenções educativas que associaram diferentes tecnologias e técnicas, podem apresentar resultados benéficos em populações com vulnerabilidades associadas a escolaridade e a renda, especialmente ao considerar que esses aspectos podem interferir diretamente na confiança das mães em realizar os cuidados necessários aos seus filhos, assim como impactar no modo como estas compreendem as informações fornecidas27. Tal aspecto ressalta que a associação da cartilha educativa associada com a EMB pode representar uma estratégia importante de educação em saúde no contexto de populações sujeitas a vulnerabilidades, conforme observado no presente estudo.
À exemplo disso, cita-se também o ensaio clínico randomizado realizado com mães de crianças menores de cinco anos e com uma maior prevalência de participantes que recebiam renda mensal inferior a um salário mínimo, e que apresentou como intervenção a aplicação de vídeo educativo associado a leitura da cartilha, destacando que a associação das intervenções apresentou-se eficaz no aumento da eficácia materna em prevenir a diarreia infantil e diminuir episódios de diarreia nas crianças da pesquisa22.
Associado a isso, ressalta-se que também diante dos resultados encontrados no presente estudo tem-se que a elevada autoeficácia materna em prevenir a diarreia infantil é um fator determinante para a diminuição dos casos da doença. Dessa forma salienta-se a importância da replicação desse estudo em outros grupos de mães com tais características de vulnerabilidade para que possa ser melhorado, de forma significativa, os índices da ocorrência de diarreia infantil em famílias que apresentam fatores de fragilidade em aspectos económicos e sociais.
Assim, conforme os dados do presente estudo, acredita-se também que a associação de tecnologias educativas com entrevista motivacional poderá contribuir para formação de vínculo entre profissional de enfermagem e mães de crianças com idade inferior a cinco anos, auxiliando para a melhora de indicadores referentes à saúde infantil, otimizando ações de promoção da saúde.
Como limitações deste estudo pode-se destacar a dificuldade de estabelecer contato telefónico com parte das participantes, de modo que a quantidade de mães que representaram a amostra referente à fase final da coleta de dados da pesquisa apresentou se reduzida em comparação com a quantidade de participantes na primeira e segunda etapa. Logo, ressalta-se a importância e a necessidade da realização de novos estudos sobre a temática com diferentes delineamentos metodológicos, de forma a embasar a assistência de enfermagem na prevenção e manejo da diarreia infantil.
CONCLUSÕES
A realização de uma intervenção educativa composta pela leitura da cartilha 'Você é capaz de prevenir a diarreia do seu filho!' associada a entrevista motivacional breve apresentou-se como eficaz na elevação dos níveis de autoeficácia materna na prevenção da diarreia infantil e na redução de episódios diarreicos. Assim, reforça-se a importância da realização de intervenções educativas que visem promover saúde e prevenir agravos e doenças diversas, incluindo a diarreia.
Ademais, o aprimoramento e disseminação de pesquisas relacionadas à eficácia do uso de tecnologias educativas, e sua consequente utilização pelos profissionais da saúde, pode proporcionar o aumento do conhecimento das mães relacionado à prevenção não somente da diarreia infantil, como também de outras doenças evitáveis na infância, e assim elevar a autonomia materna no direcionamento dos cuidados com a saúde dos seus filhos.
Ressalta-se ainda que a cartilha educativa usada nesse estudo é um instrumento facilitador no processo de educação em saúde, o que contribui para prática de enfermagem. Essa ferramenta de saúde pode ainda ser impressa e distribuída nas unidades primárias de saúde com o intuito de promover e difundir informações verdadeiras referentes aos principais cuidados relacionados a prevenção da diarreia infantil, melhorando dessa maneira os índices de saúde relacionados à temática.